(gentileza de Amélia Pais) Vejo que as tempestades vêm aí pelas árvores que, à medida que os dias se tomam mornos, batem nas minhas janelas assustadas e ouço as distâncias dizerem coisas que não sei suportar sem um amigo, que não posso amar sem uma irmã. E a tempestade rodopia, e transforma tudo, atravessa a floresta e o tempo e tudo parece sem idade: a paisagem, como um verso do saltério, é pujança, ardor, eternidade. Que pequeno é aquilo contra que lutamos, como é imenso, o que contra nós luta; se nos deixássemos, como fazem as coisas, assaltar assim pela grande tempestade, — chegaríamos longe e seríamos anónimos. Triunfamos sobre o que é Pequeno e o próprio êxito torna-nos pequenos. Nem o Eterno nem o Extraordinário serão derrotados por nós. Este é o anjo que aparecia aos lutadores do Antigo Testamento: quando os nervos dos seus adversários na luta ficavam tensos e como metal, sentia-os ele debaixo dos seus dedos como cordas tocando profundas melodias. Aquele que venceu este anjo que tantas vezes renunciou à luta. Esse caminha erecto, justificado, e sai grande daquela dura mão que, como se o esculpisse, se estreitou à sua volta. Os triunfos já não o tentam. O seu crescimento é: ser o profundamente vencido por algo cada vez maior. Rainer Maria Rilke