As das crianças, para não serem castigadas; as dos apaixonados de uma noite quando prometem um amor eterno; as de quem tudo vende, corpo e alma, para subir o preço desses bens; as dos que inventam histórias inverosímeis em busca de atenção; as dos médicos, quando compreendem que já não é possível; as dos candidatos a eleições; as dos melhores actores, tão perfeitas que se tornam verdade; as dos padres de todas as igrejas anunciando a salvação; as mais inofensivas ou as mais perversas; as mais piedosas ou as mais cruéis; as que todos descobrem num relance; as que só se conseguem detectar num momento feroz de lucidez; as que apenas se dizem ao telefone quando falta a coragem de um olhar; as que começam por pedir desculpa e geram outras cada vez maiores até que uma só vida se transforme em duas ou três vidas paralelas; as que explodem de súbito, lavadas pelas lágrimas de uma confissão; as que perduram pela vida inteira como um crime perfeito e levamos connosco para o túmulo. Sobre elas assenta desde sempre o que chamamos mundo, o que chamamos ainda humanidade. Fernando Pinto do Amaral