Consolação O dia, longo e aquático, teimou sem ter sentido, até que a noite o sacudiu e fez entrar no poço sem fundo do passado. O silêncio nem sempre magoa, afinal; às vezes só inquieta, só fustiga ao de leve, sem chegar a doer, embrulhado no veludo cinza das palavras quepodemos trazer de novo como ondas quebradas contra a muralha das horas inventadas. E há quem nos alimente o monstro. SONETO DA FIDELIDADE De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meus pensamentos Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento E assim quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa me dizer do amor (que tive) Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. Vinicius de Moraes --------