(Im)previsto Porque a luz
(Im)previsto
Porque a luz da manhã foi serena e gloriosa, porque o dia se cumpriu em poucas horas imensas, porque os momentos que douram sempre duram num qualquer escaninho da memória, o dia contou.
Fosse-me a carne opaca pensamento,
a vil distância não me deteria
e de remotos longes num momento
até onde te encontras eu viria.
Nem importava que tivesse os pés
no ponto de ti mais afastado:
o pensamento vai de lés a lés
mal pensa no lugar a que é chamado.
Mas mata-me pensar que em mim não pensas
para saltar as milhas quando vás;
feito de terra e água em partes densas,
espero em ânsias o que o tempo traz.
Nem lentos elementos trazem mais
do que choros, da nossa dor sinais.
William Shakespeare, in 366 poemas que falam de amor, antologia org. por Vasco Graça Moura, ed. Quetzal, 2003.
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Publicado em 19 de Dezembro de 2003