Terror (ou do espanto
Terror
(ou do espanto acerca da morte)
Não sendo particular apreciadora do género, porque o sobressalto é em mim (quase sempre) um efeito plenamente conseguido, vi um filme* que, sendo de terror, aborda de forma bem interessante uma questão central: o pavor e a desorientação (no verdadeiro sentido...) face à morte inesperada, súbita e violenta (no caso, um tristemente banal acidente de viação), a sua inescapabilidade, a suspensão aleatória face a um dos passageiros (que é, durante um tempo de coma que o espectador ignora, o narrador indirecto de toda a acção, vivida como uma "experiência de quase morte"). Pelo meio, os diálogos vão revelando a verdade e a mentira que delinearam a vida de uma família comum, os segredos até então guardados, a tensão, os atritos, os afectos. Os projectos são varridos no meio dos destroços, a continuidade é cortada cerce, a perda surge irreparável. Apesar de a vida parecer ganhar à brutalidade da morte, pelo resgate de uma jovem mulher grávida, no último plano a temporalidade desse resgate é lembrada. A morte, apesar de tudo, espera sempre. O tempo come as coisas, Ovídio dixit.
* Dead End, de Fabrice Canepa, com Alexandra Holden, Lin Shayne, Ray Wise, 2003.
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Publicado em 19 de Março de 2004