Era uma vez... ...um rei
Erauma vez...
...um rei que tinha livros à solta como cavalos e palavras contidas, destinadas a servi-lo e a protegê-lo sem falhas nem devaneios, exército luciferino vigilante e vigiado. Era um homem brilhante, de olhar forte e profundo, que tinha visto muitas coisas e pensado bastante sobre os outros homens. Quem o via, quem o ouvia, não poderia nunca adivinhar que era o vassalo leal de Kronos, um deus austero, rigoroso e possessivo, com quem fizera um pacto mais exigente do que qualquer suserano terreno poderia imaginar: era Kronos que dizia ao rei quem deveria ter perto e em que exacta medida, e quem manter longe mesmo amando, sacrificando apenas escassos grãos de areia escorrendo em medida invisível e sagrada. O rei sabia que era assim, e julgava que era o preço a pagar pelo poder que pensava manter. Não via que as palavras que não dizia no tempo que não tinha se tornavam em gelo no fundo da alma, cada dia aumentado até todo o sangue se tornar um imenso rio gelado, correndo parado sob o riso de Kronos.
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Publicado em 4 de Maio de 2004