Desconversa (ou o desencontro de almas entre a lebre e a tartaruga) Pode haver momentos em que a improbabilidade da comunicação, tão bem tratada por Luhman, não se reduza à diferença entre o dito e o descodificado, já de si considerável, mas parte de um abismo bem maior: a enorme distância entre desejos diversos em objecto e  intensidade. A aparente sintonia conseguida em momentos de partilha material é rapidamente estilhaçada pela distância de registos, pelo incomensurável deserto que cabe entre o entusiamo e a ausência dele, entre o o desejo e a indiferença, entre o dia e a noite. Nix, a noite. Deve ser aí que está a resposta, na sombra que desorienta e afasta Eros, abre a porta a Hypnos, a quebra, preparando a chegada de Tanatos. É indolor para uns, que nunca foram muito além da superfície e sentem apenas cansaço e vontade de fruir as reconfortantes delícias do sossego caseiro, temperado aqui e ali por incursões na carne a preço conveniente, sem encargos para a alma. Mas é uma espada afiada para outros, para os que não se resignam e procuram a luz. E nada do dizem entre si é percebido pelo outro lado. Pura solidão em estado de coma ligeiro. --------