A campanha para secretário geral do Partido Socialista tem qualquer coisa de artificial no trio de candidatos em confronto: se Sócrates representa uma ala conservadora, católica, do PS, então João Soares e Manuel Alegre são, em termos de matiz político, um pouco como Dupond e Dupont - são a "esquerda" do partido, os representantes de uma herança jacobina (socialista, republicana e laica) um tanto gasta (a usura é muto visível no vocabulário político quase anacrónico usado por Manuel Alegre, como se o mundo não tivesse mudado profundamente na última década...). João Soares tem ambições que nunca escondeu, e é um lutador de "baterias carregadas" - é um homem de meia idade com a ilusão de que a sua vida começou de novo, como se tivesse trinta anos, porque está a reviver uma pessoalíssima frescura inicial (emagraceu, tem uma vida pessoal renovada, tudo lhe parece ao seu alcance); e Manuel Alegre, o que faz nesta corrida? Responde a um apelo de quem não se revê em Sócrates e não se dá com João Soares? De quem quer um PS "de esquerda", mas fora do clã que o regeu por longos anos? Seja como for, duas candidaturas do mesmo quadrante não augura nada de bom para nenhuma delas.
A solução? O reduto habitual: as eleições presidenciais. Com Sócrates a ter o autêntico desplante de insistir em Guterres para candidato a PR (como é possível que o desejo de pagar o favor a quem o fez politicamente possa condicionar Sócrates a uma escolha arrepiante - ter um um PR que todos sabemos fraco, hesitante, fugitivo, é uma perspectiva tenebrosa - de fraquezas e hesitações, Sampaio já nos abasteceu para muito tempo...), o mais simples para o PS seria a desistência de Alegre a favor de Soares, e o apoio deste à candidatura presidencial do poeta. Amor com amor se paga...
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