Outono (ou o consolo da repetição)
É generosa, esta estação muito mais extensa do que marca o calendário, esta frescura que atravessa as manhãs com nuvens finas, que desce de novo com o final da tarde e se instala para passar a noite. Traz de novo gostos deixados em pousio durante escassos meses, o chá que acompanha a leitura horas a fio, a roupa diferente e mais envolvente, a cama feita de outra maneira para a madrugada chegar sem o corpo dar por ela. Esta estação vem e estende-se, meio indolente, e o verão ainda está, mas já não é. Mesmo na cidade, as cores são outras, a chuva deixa cair as folhas, os passos soam de outro modo. Há o conforto quase inefável de se saber o que vem a seguir, as coisas de que se gosta sempre, ano após ano - o reencontro com amigos, depois de férias, as aulas , um ou outro concerto, as catadupas de livros que invadem as livrarias a tempo das compras de Natal; e as melhores viagens, curtas, fora da época em que as multidões avassalam os aeroportos, planeadas ou decididas de repente, autênticos balões a segurar com interesse alegre. E já há-de ser inverno e ainda haverá dias de outono, com sol tépidoe manhãs douradas, a deixar tempo de sobra para se procurar ser quem se é.
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