A mudança libertadora, em particular de prisões auto-impostas, é um tempo magnífico, potenciador, o núcleo duro da própria vida (radical, como lhe digo, e ele ri-se, o brilho nos olhos capaz de ofuscar o sol, que pouca falta faz nestes dias, capaz de esconder a lua, que bem se esforça na sua plenitude para concorrer em brilho mágico, sem sucesso). Pode ser a mudança filosófica dos pré-socráticos, pode ser a mudança renascentista, tratada num plano estético quase insuperáveldepois de Dante, Petrarca e Camões; mas pode ser também uma mudança micro, no fundo da alma, uma descoberta de si mesmo a outra luz, os preconceitos tornados muralhas vãs quase risíveis, ultrapassados pela vida a fluir. Go with the flow é um motto que às vezes só pode ser assumido, por ser o único possível face à vigorosa realidade. Se nem todas as mudanças são felizes e vitoriosas, quer nas causas, quer nos efeitos, a verdade é que abrem sempre a possibilidade maior do crescimento, da procura da nova síntese. Há alguma perturbação associada? Sim, a revolução, como Copérnico deixou claro, significa uma volta completa, e isso não se faz sem algum alvoroço. Mas a perturbação criadora é a essência da vida, desde que respirada no esteio seguro da confiança plena. E aí, nesse reduto firme, é uma (a)venturosa dádiva dos céus.