Rigoroso limiar onde se vêm doer as nuvens as gaivotas a caneta o telefone a tirania da mão que sozinha continua sobre o papel a estender o seu falso arco-íris. Dói um quasi nada de tudo doem-se todas as cidades e o acidente do operário trucidado aos 25 anos. No rigoroso limiar de tudo não está apenas o que posso imaginar e o que conheço mas também a vastidão infinita do que desconheço e talvez nunca exista. Oh este negro biombo contemporâneo escondendo o peso e a medida de geração em geração. Oh sombra indelével sobre que construí a monumental idade do vácuo e o seu sangue que mancha as minhas mãos. Vê como aterrada treme a paisagem como se agita desastradamente esta ilusão de vida como ela própria chama a si a ilusão de um espelho logo quebrado. Oh como é escuro este sol que resta o hálito da noite quando todos nós à sombra de um muro velho a que nascessem malfazejas as sombras empalidecemos num estudado contraluz. O meu corpo já saíu de mim e ele é o próprio ar que respiro envenenado de espantos e remorsos. Oh vem da árvore mais alta preserva o azul da criança que passa vem do mar e põe na minha alma o teu moreno sorriso como um búzio sem a dor de uma apenas recordação Oh Mãe que tive oh céu oh silêncio assassino que iluminas como velas mortas o meu rosto atónito de pavor de vergonha e de nojo Como a morte canta ao fundo do corredor como chove lá fora como são hipócritas as palavras que coragem me falta para mais um dia. Cruzeiro Seixas