Um dia poderás chegar, tu que nunca chegas porque não és um tu ou porque chegas sempre em não chegares. Subi um dia por uma escada silenciosa e em torno era um pomar branco, tranquila maravilha e eu senti, eu vi, adivinhei a divindade amada, a soberana e delicada majestade. Que suavidade de oriente, que suave esplendor! Era o fulgor de um sono límpido, entre olhos verdes, entre mãos verdes. E num repouso de oiro adormecido era quase um rosto antiquíssimo e inicial. Contemplava a quietude de um imenso nenúfar e a fragância era quase visível como um mar entreaberto. Era um rio detido ou uma tersa nuca ou um braço estendido que descansa entre ribeiros primaveris ou era antes a serena felicidade e era uma boca da terra que não cantava que não dizia o silêncio ardente que no peito de espuma cintilava. António Ramos Rosa