Há cerca de uma semana, vi um filme («8 mile») que, por razões várias relacionadas com projecções e identificações, me trouxe a questão recorrente de aprender a lidar com a inevitável usura do tempo sobre o que de mais insignificante temos - aquilo a que os outros nos ensinam a tomar por beleza. Envelhecer é um desafio difícil, sobretudopara as mulheres, e em particular nesta sociedade de consumo onde a juventude é deificada. Mesmo usando o distanciamento como escudo, mesmo trabalhando sobre o pecado mortal da horrenda vanitas com os instrumentos da razão, mesmo relembrando a voz sábia e antiga que tanto valoriza o tempo e reduz a importância da decadência física, ainda assim é duro. E eis que, de repente, num minuto brevíssimo, um acidente tolo provoca, por reacção alérgica extremamente dolorosa, uma queimadura que me impede de ver. Que me impede, portanto, de ler. Que me impede, durante horas, de ser autónoma. A lição foi clara. Tomara que saiba interiorizá-la devidamente. Sic transit gloriamundi.