O meu corpo espalha incêndios. Estou certo de que não terás mais de viver comigo ou com o que resta de mim. Deixo-me adormecer durante horas para que saibas que me afasto a passos largos, com sombras por detrás. O meu corpo, por onde quer que vá, espalha incêndios que não me recordo como apagar - pensar que um fogo assim se alimenta cresce reproduz-se e morre e que nada mais deixa a pedir. Para que hoje eu entre pela porta bastará que os nossos corpos se encontrem num lugar onde não vou dizer. Chegarás, por teu pé, aonde os velhos descansam e onde cicatrizes rolam pelo corpo e pela consciência. Com o tempo, o que não aprendeste quando nasceste torna-se inerente a ti, torna-se um braço, uma mão, um dedo que se estende na memória e que aponta no mapa da cidade a casa as paredes e o soalho as prisões os âmagos de quem partiu de lá - como nós. E por hoje, fico com fome. Pelos caminhos as fogueiras como pequenos faróis no nevoeiro que levanto ao caminhar enquanto que os meus pés se tornam rasgos na estrada e eu me dilúo na multidão para ser escrito. E um jovem toca-me no ombro e então desperto e estou próximo a dois passos do que deixei para trás. Sérgio Xarepe