Quero-te
(gentileza de Amélia Pais)
Quero-te às dez da manhã, e às onze, e às doze do dia. Quero-te
com toda a minha alma e com todo o meu corpo, às vezes, nas
tardes de chuva. Mas às duas da tarde, ou às três, quando me
ponho a pensar em nós os dois, e tu pensas na comida ou no tra-
balho diário, ou nas diversões que não tens, ponho-me a odiar-te
surdamente, com a metade do ódio que guardo para mim.
Mas logo volto a querer-te, quando nos deitamos e sinto que foste
feita para mim, que de alguma forma mo dizem o teu joelho e o teu
ventre, que as minhas mãos me convencem disso, e que não há
outro lugar onde eu venha, aonde eu vá, melhor que o teu corpo.
Tu vens toda inteira ao meu encontro, e desaparecemos os dois
um instante, metemo-nos na boca de Deus, até que eu te diga
que tenho fome ou sono.
Todos os dias te quero e te odeio irremediavelmente. E há dias
também, há horas, em que não te conheço, em que me és estranha
como a mulher de outro. Preocupam-me os homens, preocupo-me
comigo, distraem-me as minhas penas. É provável que não pense
em ti durante muito tempo. Já vês. Quem poderia querer-te
menos que eu, meu amor?
Jaime Sabines
Publicado em 27 de Fevereiro de 2006