Apesar dos avisos, das cautelas, dos caldos de galinha, perdi-te numa grande superfície em domingo de bola na luz. Ia comprar-te roupa, aos jornais, ver se o café já chegara, e de repente, enquanto olhava a montra engalanada de chocolates, estava só o teu sítio. Foste no turbilhão da multidão ululante com uma bandeira na mão gritar por portugal, sentei-me num banco a ver televisões e na esperança de te ver quando filmassem as claques. Passou a hora e meia mais o intervalo -nem preciso dizer que nunca mais te vi. Agora investigo até ao mínimo detalhe o conceito de amor nos vários pontos da terra e sei que hei-de encontrar um que me corresponda. Pois o mundo é uma bola chutada num anúncio da coca-cola, às vezes o amor só se vê quando desaparece, quando comíamos conquilhas e bebíamos vinho verde chamava-se amizade. Mas eu ainda só vou no ocidente mais ocidental. De olhos vermelhos de tanto chorar, primeiro por desgosto, depois pela raiva da estupidez de chorar, cravo os olhos em mim mesmo a sentir bater o coração ao centro, se ao menos à hora da morte se decifrasse o enigma. Mas nem isso se sabe ao certo, é essa a dor criativa da incerteza. E criar cria-se assim mas pode ser coisa horrível. Porque mostrar a dor sistemática, onde pairam nuvens negras, não é mostrar a tua beleza, nem a minha, ou a da escrita. Talvez se comprasse bilhete e me misturasse com todos quem sabe se não te encontraria, a comer nougat e a rir, achando normal eu ali. Não, nunca mais te vi, por vezes conto um conto para fingir que tive um sonho, sem vergonha a tremedeira cresce em pernas e em braços, aquele banco para mim ficou um lugar sagrado e volto aos domingos sempre, pode ser que te encontre na igreja dos costumes. Helder Moura Pereira