Da Procura
(gentileza de Amélia Pais)
queria dizer-te como as minhas mãos te procuram.
como há um sentido próximo à nossa delicadeza.
queria que soubesses a música. o mar dentro da concha.
um gesto com o pesar da sede. a coincidência da paz.
queria que regressasses bebendo deste poema anelante.
a tempo de escutares a impassível alma dos pássaros.
desentardecendo a meu lado. azulando a última flor.
porque tudo se levanta no murmúrio breve do outono.
tudo se perpetua. tudo se reacende. tudo se comemora.
unindo as águas dos sentidos à mais longa hora do dia.
suspendendo docemente um dos lados do esquecimento.
e tudo procura uma voz. um rio. uma irreversível alegria.
uma inspiração. um gesto interior ao coração do tempo.
uma palavra pulsando fremindo a folhagem da ternura.
as mãos cercando o teu corpo. a tua voz diluindo a sede.
Daniel Gonçalves
Publicado em 19 de Dezembro de 2006