Está frio, mesmo muito frio. Desde ontem que o corpo tenta habituar-se ao vento que corta, a aresta viva do inverno no mar do Norte a endurecer os passos. O céu mutante, de um cinza pesado ao amanhecer, quando as bicicletas correm sobre o gelo a caminho dos interiores alegres, sóbrios e aquecidos onde os seus donos vão passar o dia - esse tempo de luz breve, com raios de sol a fingir que aquece. Gentes cortês, afável mesmo, calma, o tom lápis lazúli dos olhos a mostrar como é o longínquo verão. Gente de traços Inuit, estatura mediana, passo quase sempre apressado. Uma cidade onde a arquitectura é um conforto e não uma afronta, onde os séculos se sucedem sem conflito, sem desfeita, sem desprezo. Canais povoados de patos e cisnes, pássaros de inverno pousados nas árvores nuas do Jardim Botânico. O Norte de um Sul que somos, confundidos com italianos (mas não com espanhóis - porque será?). Um Norte de uma Europa que aqui continua, vinda da Alemanha e dos Países Baixos, tornando-se adjectivo: nórdico. Um frio bom para olhar em volta. Sammen.