Nunca se devem deixar as coisas a meio
(gentileza de Amélia Pais)
Uma aldeia ouve desolada
O canto do pássaro ferido
É o único pássaro da aldeia
E foi o único gato da aldeia
Que o devorou por metade
E o pássaro deixa de cantar
O gato deixa de ronronar
E de lamber o focinho
E a aldeia faz ao pássaro
Um funeral maravilhoso
E o gato que foi convidado
Segue atrás do pequeno caixão de palha
Onde io pássaro morto vai estendido
Levado por uma menina
Que não pára de chorar
Se soubesse que isso te deixava tão triste
Disse-lhe o gato
Tinha-o comido inteiro
E depois contava-te
Que o tinha visto partir a voar
A voar até ao fim do mundo
De onde tão longe que é
Nunca ninguém volta
Seria para ti um desgosto mais pequeno
Unicamente tristeza e saudades
Nunca se devem deixar as coisas a meio.
Jacques Prévert, trad. de José Lima
Publicado em 4 de Fevereiro de 2007