Preparei a casa para te esperar: procurei nos cantos o passado e engastei-o à soleira da porta, petrificado em dor, mas refulgente. Não foi necessário mudar de casa para te esperar. Bastou a tua vinda, ainda de madrugada, para que tudo mudasse, e a lua crescente surgisse ao meio dia. A cama está feita, a mesa está posta, nas compoteiras brilham sobremesas feitas para adoçarem a tua boca quando a vida amargar, travar-se o riso. Meu corpo não é o mesmo de ontem, mas é mais virgem, através das horas, que me apartaram de outros desejos dos quais me afasto, emigrada de mim mesma. Foi gratuito o teu chegar. Por isso fica: permanece em mim e esquece a lágrima. Te esperei para chamar-te "meu amor", embora ingressem em minha voz e corpo antigas sereias, com pentes de espelhos, a retrançar meus cabelos destrançados, e te convidem para o sábio mergulho onde habitaremos: nós e o tempo. Maria da Conceição Paranhos