De novo e sempre o mesmo, dir-me-ás, amigo. Contudo, o pensamento do exilado, o pensamento do prisioneiro, o pensamento Do homem que também se viu reduzido a mercadoria Tenta mudar-lho, que não consegues. Queria, se calhar, ser rei dos antropófagos Desbaratar forças que ninguém procura E passear pelos campos de agapantos E ouvir os batuques debaixo dos bambus Enquanto os cortesãos dançam com máscaras grotescas Mas a Terra que massacram e queimam como um pinheiro e que vês, Ou no vagão escuro, sem água, partidas as vidraças, durante noites e noites, Ou no barco incendiado que há-de naufragar como ensinam as estatísticas, Tudo isso criou raízes no espírito e não muda, Tudo isso floriu imagens parecidas às árvores Que lançam na floresta virgem seus ramos Que voltam a cravar-se na terra e a florir E lançam ramos e voltam a florir e galgam léguas e léguas, Uma floresta virgem de folhas mortas é o nosso espírito. E se te falo por fábulas e parábolas, É porque assim são mais doces ao teu ouvido e porque o terror Não se fala, que é coisa viva, Que é coisa muda e avança sem parar; Goteja todo o dia, goteja durante a noite A dor das recordações. Giórgos Seferis, tradução Manuel Resende