Como poderemos beijar essa boca que apenas se anuncia com a suave tristeza de quem ainda ama as sílabas do sangue ou a lua cálida das velas? Essa boca talvez seja apenas uma boca de sombra e quase uma boca de cal mas a sua forma ainda é uma margem estremecida uma erva que respira sobre a pedra azul da melancolia Que palavra poderá dar um espaço à sua sede como uma guitarra que lentamente se acende na noite? Mas no peito frágil como um pássaro palpita ainda um astro vibrante como uma haste inclinada pelo vento Ela acaricia a sua crisálida de areia como se fosse o corpo amante ou uma palavra preciosa Não posso desenhar o movimento do seu coração nem encontrar a palavra que fosse um beijo vacilante mas incandescente O meu pulso no entanto estremece com o rumor de um sangue que desejaria ser a luz da sua sede António Ramos Rosa