Galope Amarelo
Quando ele voltou
a moça do portão estava casada
o prefeito era uma cruz e uma placa
as aves mudaram de itinerário
como os ônibus
o irmão mais moço tomava ópio
para esquecer.
Quando ele voltou
o empregado da esquina respondera
a um processo
onde perdeu a esperança e os dedos
o pai fuzilara um estudante
a mãe fugira com um mascate.
Quando ele partiu
a primavera galopava nos rosais
os campos de begônia floresciam
o gado esturrava nos currais
a terra desafiada vicejava como
uma égua na véspera do galope.
Quando ele partiu
o alimento dos olhos era verdura
de paisagem além da cerca
as goiabas enchiam os cestos
as mulheres voltavam com os meninos
os velhos falavam de assombração
a lua espreitava o pátio e o quintal.
Quando ele voltou
o ministro citava o arquiteto
com a pretensão de restaurar
o tempo à revelia dos relógios
o muro substituía o horizonte
autoridades sonolentas distribuíam
o passaporte dos homens para o sanatório.
Quando ele voltou
as leis se haviam tornado ainda mais fósseis
as oligarquias muito mais poderosas
os poderosos mais astutos
o ministro lembrava ? a pá sob os escombros?
o menino relia as manchetes da guerra
os preconceitos rimavam com a economia.
Quando ele voltou
Havia uma encruzilhada e um alto falante
a moça do portão estava casada
o irmão caçula era um soldado velho.
Quando ele partiu
a primavera galopava nos rosais.
Quando ele voltou
o céu era só um galope amarelo.
Florisvaldo Mattos
Publicado em 25 de Agosto de 2008