Para negar o amor
Os olhos não fitam
a mão que afaga
o coração em que não pulsa
o sangue que não percorre
a veia dissecada
alma dilacerada
vísceras
artérias
olhos ávidos
distantes
a cada instante
contemplando a madrugada
sumindo
porque não houve noite
nem dia
e não surgiu a face mais visível
da lua
não mirei a tua
não devassaste a minha
não encontrei a casa
não saíste à rua
a cidade é apenas
uma suposição geográfica
esquecida no tempo
que não se move
porque já não há tempo
mensurável
e portanto não houve
e jamais haverá fim de semana
tudo uma interminável
segunda feira
mítica
insana
e o mar não mais que uma referência
na linha imaginária
inatingível
ao pensamento que se forma
e se desfaz
o que apraz
a nossa paz
porque não existe luz
não há razão
a mão não toca
a boca não sente
o beijo
teu desejo
meu desejo
de não sentir desejo
minha ânsia
teu suave riso
meu sublime pranto
a tua ida
a minha volta
o nosso encontro
a cada desencontro
para negar o amor
até as últimas conseqüências
porque não existes tu
nem existo eu
é tudo um paradoxo monumental.
Astolfo Lima Sandy
Publicado em 10 de Janeiro de 2009