Abro a gaveta onde se esconderam uns fantasmas e eu guardei outros, disfarçados de palavras, camisas limpas que não pude vestir e papel em branco, envoltos em ninhos de sombras e pedaços de luz da lamparina de azeite do oratório de minha mãe- abro a gaveta vagarosamente, assustado para que não me assustem como quando eramenino e os temia mas conversava com eles na escuridão do quarto. Tenho medo da gaveta e desses seus conteúdos que poderão trazer de volta osfantasmas, os que guardei e os que se esconderam apenas esperandoo tempo de se apresentarem àminha solidão e desesperança para cobrar a vida que não tivemos eu e os meus predecessores, eu e os meus perseguidores, eu e os que não me amaram, eu e os que não pude amar - essesfantasmas todos perdidos e escondidos nestas gavetas de ventos e de fantasias entreabertas pelos vácuos de minha vida e depositárias,como fantasmas, dos anseios do tempo inteiro, e do que restou de minha inocência dos anos de luz, esses curtos anos de mitos e fantasias realizados no cristal da infância. Álvaro Pacheco