Talvez ao poeta baste o ritmo das palavras em desafios murmurantes e os gritos explosivos; o desafio do andor carregado e a luz introduzida sob o manto; ser o ocorrido e a versão descontrolada do início: indícios não bastam ao poeta que continua e termina e recomeça. Talvez ao poeta baste a incompreensão dos ares satisfeitos dos bonecos alçados à condição de estetas; profetas em voz alta ensaiam temas preferidos aos tontos espíritos desnecessários. Talvez baste ao poeta a sensação de antes de a matéria ser solidificada e flutue em asas descobertas aos ventos de solidário espaço. Talvez ao poeta baste o atentar sereno das noites antagônicas e os dizeres gravados nos panfletos que são entregues anônimos. Talvez baste ao poeta o fruir da fruta ao gosto menos azedo das notícias participando mortes antes do tempo (todo o tempo é antes) previsto na antecipação frígida das esperas. Talvez ao poeta baste levantar a mão e pedir ao garçom a bebida de sempre, a comida deixada sobre o prato, o distrato entre amigos após a ceia: cada um em seus afazeres. Talvez ao poeta baste saber-se nu diante da hora acertada para a volta; ser da revolta o ânimo e da crueldade explicitada em nomes o anônimo revoar das aves; sobre as aves ao poeta cabe recriminar a mão que oferece o pouco. Talvez baste ao poeta ser poeta. Adivinhar no texto a descoloração do átimo, o pátio de desertadas árvores infrutíferas; o desfolhar do outono, o renascer primaveril das flores em pétalas abertas. Talvez ao poeta baste discorrer em mãos agitadas ao vazio sobre a perdição, a contrição, a educação adulterada em números e cientificamente expor ao todo o menos; ao menos cabe o protesto. Talvez ao poeta baste a consecução do plano invertido em sonhos de descidas aos infernos particularizados no extrato do infortúnio; ser seu próprio oposto de reescritas notas no esforço desconcentrado ao nada. Talvez baste ao poeta o anúncio do amor distanciado em dias, meses, anos e décadas: o reencontro no aperto sentido – o grafite quebrando a ponta – como lâmpada queimada: a tortura acompanhada à porta pelo degredo do segredo sendo revelado. Talvez ao poeta baste o reconhecimento da presença e a indiferença rente ao caminho não percorrido; o banco da praça ocupado pelo corpo despreparado em ocorrências e a decorrente história mal contada. Talvez ao poeta baste olhar o perto e retirar o longe desconhecido em físicos acidentes: a geografia estanque do planeta; o lento deslocar das placas. Talvez baste ao poeta a necessidade da urgência intercalada ao langor do isolamento. Saber ficar estático e revolver as cinzas em busca do acidente. Talvez ao poeta baste alisar o pelo do animal sobre o colo deslocado, descobrir ensinamentos simiescos ensimesmados aos ensinamentos. Talvez ao poeta baste possuir a chave enferrujada da porta secundária por onde entram minotauros instalados nas peças lendárias dos amantes. Talvez ao poeta baste realizar o sonho da criança perdida em crescimento: recuar ao tempo anímico das paredes sendo preenchidas em riscos produzindo imagens do dia acondicionado. Talvez baste ao poeta se desvencilhar da hora categórica dos negócios, perder o prumo, o rumo, desviar das pedras rolantes dos embustes; salvar a pele do desconsolo e o tédio dos amantes. Talvez ao poeta baste se dizer distante o tanto permitido, perto o quanto possuir de forças para se entranhar nas notícias repetidas. Talvez ao poeta não baste o descobrimento de novas terras, exija reconhecer a profundeza espacial dos mares e o executar da sinfonia dos cometas: em suas caudas, sabe o poeta, trafegam poeiras estelares. Pedro Du Bois