Paisagem com uma Lágrima
(gentileza de Amélia Pais)
Vincent Van Gogh, hortelão irreal do Meio-dia.
Tu pintavas a chama tubular das gramíneas.
E pintavas vinhedos, da margem nítida do vinho.
Cerejeiras devoradas pelas mil bocas de suas próprias flores
e lugares de Abril, com um sereno voo de ametistas
vindas de um confim de ídolos unânimes.
Pintavas a cor que gira no côncavo absoluto do espaço
— astro contínuo nos seguintes sóis —
e eternos sóis giradores, sobre teus girassóis.
O trigo encabritado nas colinas.
Um poente com seu anjo levadiço
que até hoje divide, com seu passo, o rio.
Vincent Van Gogh, pintor da celeste idolatria.
Tu pintavas o céu, como um Deus fugitivo.
O céu em remoinhos de idêntica safira.
O ritmo circular de seus abismos.
Os astros que Deus abre com seu indicador.
O céu que nos dói nas pupilas
ao sabermo-nos escravos da hidra.
Céus, onde, com uma lágrima, habitas.
César Dávila Andrade, trad. Paulo Rato
Publicado em 30 de Abril de 2010