Essa noite estranha, é uma noite de medo, pavor de mim mesmo. Quando penso e me vejo pensante, ouço o ruído incessante — enervante — do mar, tenho medo. Do latido de um cão longínquo, tenho medo. E receio tanto a escuridão silenciosa da noite... E me assusto tanto com o barulho da folha seca e do vento tenebroso na encosta... A existência só e a coexistência só de um mundo de mortos me amedrontam, apavoram. E tenho um pavor imenso de ser e de sentir... Queria ser apenas algo e não querer... O pavor do silêncio noturno, povoado de fantasmas que riem do meu temor, o medo da morte porque parece uma noite de silêncio profundo, faz ouvir minha fraqueza, um cão latindo ao longe, triste, um som de silêncio no ouvido, enlouquece e assusta como se houvesse — e talvez haja — algum estranho na escuridão. E me assusto com a escuridão e o silêncio — nadas — que reinam em mim... Vazio que reina em mim — tudo — possível e impossível. Alma solitária jogada num abismo, vê-se lá de cima do penhasco onde o mar encontra as pedras, um grunhido, um bafo ofegante — monstro — nas minhas costas infinitas, do tamanho da escuridão que esconde o mar dos olhos e nos ouvidos preenche a imaginação. João Bosco da Encarnação