Beber
À tua saúde:
levanto o braço e bebo.
Onde estarás ó rapariga que vieste
visitar-me algumas vezes no verão passado?
Como tudo se vai transformando em outra coisa.
Como falarei de mim num tempo que há-de vir?
Estarei pobre de quê e há-de faltar-me quem?
Terei aprendido a privar-me de mais alguma coisa)?
Quem sabe se não serei apenas mais feliz.
As páginas brancas de livros que talvez sejam meus
e se não forem há-de ter pouca importância.
hei-de escrever cartas se não escrever romances.
E terei em que pensar aconteça o que acontecer.
De todas as voltas que o mundo pode dar
nenhuma que me ponha a cabeça no chão e os pés no ar.
Sou eu que me o permito às vezes para divertir-me
e fazer circular o sangue nas veias mais cimeiras.
Entretanto que dizer? Não chove nem há sol,
não é um dia particular nem um mês de férias.
Estar aqui à espera é apenas estar aqui e esperar.
rapariga que hei-de voltar a ver levanto o copo
e é à tua saúde que entorno o vinho dentro.
Quero ir contigo e ver os teus olhos contentes
E um dia talvez hei-de explicar-te o que se sente.
Por ora digo: bolas! E que estás longe.
E que chatice. E que nunca mais decido.
Mas que importa o que tu fazes e o que eu digo:
Tu estás aí e eu aqui, é longe e é difícil.
Há tantas maneiras de passar o tempo.
E entretanto a vida continua e eu digo adeus,
levanto o braço de novo e vou agitando o lenço.
João Camilo
Publicado em 21 de Fevereiro de 2011