Fazer compota em julho
(gentileza de Amélia Pais)
Uma mulher a fazer compota em julho
revela-se resignada a viver com o marido.
Não vai fugir às escondidas com o amante.
Se assim não fosse, de que serviria cozer fruta com açúcar?
E vejam como ela o faz de boa vontade,
como um trabalho feito com amor,
mesmo que o espaço tenha um valor excessivo
e não haja sítio para armazenar os boiões.
Uma mulher a fazer compota em julho
está a preparar-se para ficar por aqui durante uns tempos.
Pretende aquartelar-se e hibernar
para atravessar os desconfortos do inverno.
Se assim não fosse, por que razão - e, notem,
sem que haja nisso qualquer dever -
gastaria ela o verão tão breve
a limpar restos de compota.
Uma mulher a fazer compota em julho
no meio do caos de uma cozinha cheia de vapor
não se está a preparar para fugir para o Ocidente
ou para comprar um bilhete para os EUA.
Essa mulher há-de escapar aos desmoronamentos da neve
salva pelo sabor da fruta.
Na Rússia quem faz compotas
sabe que não há saída.
Inna Kabish, trad.Luís Parrado
Publicado em 14 de Setembro de 2011