O fim da estrada
Bem junto do portão
da minha Torre branca de Marfim,
silente e pequenina,
que brilha, intensamente, ao sol de verão
como gota de orvalho cristalina
nas folhas dum jasmim,
passa uma estrada
que tem nas valas rosas de toucar.
Via suave, ainda não trilhada,
que ninguém sabe, não, onde vai dar!
Um camponês velhinho,
de negra tez e fronte recurvada,
cabelos brancos, mais que o branco linho
que a moça doba em horas de lazer,
me disse que nascera aquela estrada
ali, na hora em que me viu nascer.
Contava mais caminhos de montanha
do que estrelas o céu pode contar,
mas essa estrada lisa, assim tamanha,
nunca soubera, não, onde ia dar!
Aéreo sonhador
— um misto de Pierrot e de Arlequim —
à luz do sol que me aquece e me desvela,
já vão vinte anos que parti por ela,
há dez não vejo a Torre de Marfim!
A ocultar-me o passado — que se esfuma
numa saudade que faz mal à gente —
e a esconder-me o futuro até ao fim,
há uma cortina azul de fina bruma
que, penosa, se arrasta à minha frente
e, insondável, se estende atrás de mim!
Há vinte anos caminho, no entretanto,
ora abatido, ora de novo audaz:
ou vendo o fim tão longe, num quebranto,
com mil desejos de voltar atrás.
Ora tropeço e caio e vou seguindo
desalentado já deste medonho,
interino correr, ora vou rindo,
na mente a abrir a flor dum novo sonho.
Da minha Torre branca de Marfim
há vinte anos parti, brilhante o olhar,
buscando o fim da estrada, que, sem fim,
não sei, eu próprio, ainda, onde vai dar.
Álvaro Feijó
Publicado em 5 de Novembro de 2011