Uma noite acordarei junto ao corpo infindável da amada, e meu sangue não se encantará. Então, rosa a rosa murcharão meus ombros. Quer dizer que a sombra carregará meus sentidos de distância, como se tudo fosse o cheiro que as ervas pungentemente perdem através do silêncio. Plácido chegarei à mesa, e de súbito meu coração se atravessará de gelo puro. O vinho? Perguntarei. Flores de sal cobrirão a luz poderosa do meu olhar. Tempo, tempo. Eu próprio perguntarei no recente pasmo da minha carne: o vinho? Rosa a rosa murcharão meus ombros. Então lembrarei a vermelha resina, o espesso murmúrio do sangue, o ocre e sobrenatural aroma das acácias. Tentarei encontrar uma forma. Com beijos antigos um momento ainda queimarei o corpo solitário da amada, direi palavras de uma ternura azebre. E uma vez mais me perderei, dizendo: o vinho? Rosa a rosa murcharão meus ombros. Herberto Hélder