Disse, num dia de grande e fecunda inspiração, Um grande e admirável senhor, dado às letras (certamente conceito e postura vindos diretos do seu coração), Que as palavras são, por vezes, bonitos cristais E outras vezes afiados e cruéis punhais O que, em boa da verdade, Ele bem soube o que disse, não foram tretas…. São preciosas quando, relâmpagos de beleza, Significam verdade, pureza, inocência, E não naufrágio, despudor ou aparência Nem inverdades ditas com inconsequente leveza. São como dores fundas e indizíveis, as palavras Quando, mágicas, desvendam ambiguidades (Talvez reveladoras de certas necessidades), E transformam amizades boas em outra coisa Qualquer. As palavras têm poder e temperatura interna Têm corpo e podem cegar qualquer um Não só eu ou tu, mas outro mortal comum Mesmo quando ditas ainda em ventre materno… Muitas vezes podem salvar, proteger ou, sensuais, Prender o ingénuo amante nas teias do amor (mal sabe ele as suas futuras penas de dor….) E podem também dar cor e luz à vida e ao mais. Há palavras que doem, como mentiras que me Pregam E palavras que aliviam, como mães que nos Embalam São quimeras, castelos e dragões imaginados, As palavras, quando me abraçam e quero acreditar Porém tenebrosas, quando me devassam e reduzem A nada… Ou quase nada. É na inegável síncope da noite E na metáfora indecifrável da vida Que as palavras tomam corpo E transformam o que supostamente se tem Naquilo que se tem que ter. São sonâmbulas, como algozes, as palavras E reinam entre as trevas e os montes desertos Da nossa imaginação, Onde o limbo e a quase consciência Tomam conta dos nossos sonhos mais secretos. As palavras são fascinantes e fortes mistérios Com poderes absolutos - e mais sérios Do que se pensa… Quem mente, com palavras, sobre o que é Cai no primeiro degrau da sua consciência. Difícil o enleio, já que aqui não há ciência, No mastigar verdades com certeza e boa-fé. Mas nem sempre serão as palavras que me dirão Aquilo que quero ver… Serão sempre os meus olhos que verão Aquilo que não existe. V.G.