Estranhas são as vias do Amor: e bem o sabe quem as quer seguir: muitas vezes ele perturba o coração seguro: quem ama não encontra constância. Aquele a quem a Caridade toca no fundo da alma conhecerá muita hora de desolação. Ora ardendo, ora frio, agora tímido e ainda há pouco ousado, numerosos são os caprichos do Amor. Mas a toda a hora ele nos lembra a nossa imensa dívida para com o seu alto poder, que nos atrai e só a Ele nos destina. Ora gracioso, ora terrível, agora próximo e ainda há pouco distante: para quem o conhece e nele confia isto mesmo é alegria maior. Como Amor num só acto fere e abraça! Ora humilhado, ora exaltado, agora escondido, manifesto ainda há pouco, para se ser um dia atingido pela dilecção é preciso arriscar muita aventura – antes de alcançar aquele ponto em que se desfruta da pura essência do Amor. Ora leve, ora pesado, sombrio agora e claro ainda há pouco, na doce paz, na sufocante angústia, dando e recebendo – dupla vida, serve aos espíritos que se perdem no amor. Hadewijch de Antuérpia, trad. João Barrento