Todos nasceram velhos — desconfio. Em casas mais velhas que a velhice, em ruas que existiram sempre — sempre assim como estão hoje e não deixarão nunca de estar: soturnas e paradas e indeléveis mesmo no desmoronar do Juízo Final. Os mais velhos têm 100, 200 anos e lá se perde a conta. Os mais novos dos novos, não menos de 50 — enorm'idade. Nenhum olha para mim. A velhice o proíbe. Quem autorizou existirem meninos neste largo municipal? Quem infrigiu a lei da eternidade que não permite recomeçar a vida? Ignoram-me. Não sou. Tenho vontade de ser também um velho desde sempre. Assim conversarão comigo sobre coisas seladas em cofre de subentendidos a conversa infindável de monossílabos, resmungos, tosse conclusiva. Nem me vêem passar. Não me dão confiança. Confiança! Confiança! Dádiva impensável nos semblantes fechados, nos felpudos redingotes, nos chapéus autoritários, nas barbas de milénios. Sigo, seco e só, atravessando a floresta de velhos. Carlos Drummond de Andrade