Eu queria ir para a universidade, mas a minha tia Persis, que era rica, não me ajudava. Dediquei-me, por isso, a arranjar jardins e relvados. Com o dinheiro que ganhei comprei os livros de John Alden e tive que lutar para sobreviver. Eu queria casar-me com Delia Prickett; mas como podia fazê-lo, com o pouco que ganhava? E lá estava a tia Persis, com mais de setenta anos, sentada na cadeira de rodas, meia morta já, com a garganta paralisada. Quando comia parecia um pato, a sopa a escorrer-lhe da boca. Porém era gulosa, e investia o dinheiro em hipotecas, sempre consumida com as contas, mais as rendas e as letras. Nesse dia estava eu a serrar lenha para ela e, nos intervalos, ia lendo Proudhon. Entrei dentro de casa para beber um copo de água e lá estava ela adormecida na cadeira. O livro do Proudhon estava em cima da mesa, e em cima do livro o frasco de clorofórmio que ela por vezes tomava contra as dores de dentes. Embebi em clorofórmio um lenço de mão e pressionei-o contra o seu nariz até ela morrer. Oh, Delia, Delia, foste tu e Proudhon quem me deram forças para isso, e o médico legista concluiu que a morte se devera a uma paragem cardíaca. Casei com Delia e fiquei com o dinheiro – Enganei-te bem, Spoon River, ou não? Edgar Lee Masters, trad. José Miguel Silva