Nomeadamente, para a Tia Ermelinda
Que o ano civil nos seja breve
Que os generais adoptem muitos filhos
e um modo mais pacífico de estar
em qualquer lado das fronteiras
Que a livre circulação de pessoas e bens
passe por menos portagens
Que a Tia Ermelinda continue bem-sucedida com os seus morangos
E flores silvestres
Que o meu País se alongue, e o teu também,
em terra e mar e mais além
Que abrande a carestia de vida
e nos seja mais cara a vida
Que seja clara sempre e sempre luz
a luz dos teus olhos, a preparar alvoradas
Que ganhe o sabor da terra todas as cores que imaginares
e sejam muitas, e diversas, as cores pensadas
Que valham a pena as batalhas
e tenham sangue dentro das veias
Que haja muitas bicicletas a fazer um Verão benigno em Janeiro
Cachecóis em Julho
Presentes em Abril, sempre,
e Outubros livres, feitos em férias
Que te organizes, no mínimo e competentemente, para o mais
(gostaria de ser capaz, mas nestas coisas de organizações
a coisa é-me ingrata, bem sabes)
Que não te aflijam as questões da coerência
Que haja muitas vezes rebeldia nos teus gestos,
e calma na tua ansiedade
(com comprimido adequado à mão, a dar-se o caso – se possível não)
Que não te passe a sede e sejas saciada
em partes dos dias, com alguns e suficientes exageros
Que não se acabe o comércio de bairro e os jornais em papel
Que os Correios não se reciclem até à exaustão
Que saibas regatear com qualquer governo
o que não tem preço
Que mantenhas o sentido de alguma piedade na análise social
Que tenhas um bom coito, e uma casa que não seja derradeira
Que a amargura não sufoque, ao fim e ao cabo das viagens
Neste ano civil que quero breve breve breve.
Um beijo, minha querida,
fica bem.
Rui A.
Publicado em 31 de Dezembro de 2014