Que o ano civil nos seja breve Que os generais adoptem muitos filhos e um modo mais pacífico de estar em qualquer lado das fronteiras Que a livre circulação de pessoas e bens passe por menos portagens Que a Tia Ermelinda continue bem-sucedida com os seus morangos E flores silvestres Que o meu País se alongue, e o teu também, em terra e mar e mais além Que abrande a carestia de vida e nos seja mais cara a vida Que seja clara sempre e sempre luz a luz dos teus olhos, a preparar alvoradas Que ganhe o sabor da terra todas as cores que imaginares e sejam muitas, e diversas, as cores pensadas Que valham a pena as batalhas e tenham sangue dentro das veias Que haja muitas bicicletas a fazer um Verão benigno em Janeiro Cachecóis em Julho Presentes em Abril, sempre, e Outubros livres, feitos em férias Que te organizes, no mínimo e competentemente, para o mais (gostaria de ser capaz, mas nestas coisas de organizações a coisa é-me ingrata, bem sabes) Que não te aflijam as questões da coerência Que haja muitas vezes rebeldia nos teus gestos, e calma na tua ansiedade (com comprimido adequado à mão, a dar-se o caso – se possível não) Que não te passe a sede e sejas saciada em partes dos dias, com alguns e suficientes exageros Que não se acabe o comércio de bairro e os jornais em papel Que os Correios não se reciclem até à exaustão Que saibas regatear com qualquer governo o que não tem preço Que mantenhas o sentido de alguma piedade na análise social Que tenhas um bom coito, e uma casa que não seja derradeira Que a amargura não sufoque, ao fim e ao cabo das viagens Neste ano civil que quero breve breve breve. Um beijo, minha querida, fica bem. Rui A.