Eu – adolescente? Se, de repente, aparecesse aqui, agora, diante de mim, saudá-la-ia como pessoa que me é próxima, embora seja, para mim, estranha e distante? Verter uma lágrima, beijar-lhe a testa pela simples razão de termos a mesma data de nascimento? Tão poucas semelhanças entre nós, quiçá, apenas os ossos são os mesmos, a caixa craniana, as órbitas. Já que os olhos dela parecem maiores, as pestanas mais compridas, ela mais alta e todo o seu corpo revestido com uma pele lisa, sem mácula. Na verdade, ligam-nos parentes e conhecidos, no mundo dela, porém, quase todos estão vivos, enquanto no meu já não há quase ninguém deste círculo que tínhamos comum. Somos tão diferentes uma da outra, pensamos e falamos sobre coisas tão diferentes. Ela pouco sabe – mas com uma teimosia digna de melhores causas. Eu sei muito mais – mas sem nada saber ao certo. Mostra-me uns poemas, escritos com letra clara e cuidada, como já há muito eu não escrevo. Leio esses poemas e leio. Bem, talvez este daqui, se o reduzirmos e corrigirmos aqui e ali. O resto nada de bom augura. A conversa está difícil. No seu pobre relógio, o tempo ainda é vacilante e barato. No meu, já é muito mais caro e preciso. Na despedida nada, um breve sorriso e nenhuma comoção. Somente quando se afasta e, apressada, se esquece do cachecol. Um cachecol de pura lã, às riscas coloridas feito em croché para ela pela nossa mãe. Ainda hoje o tenho. Wislawa Szymborska