O gato fala. Mas o que é que diz o gato? Deves pegar num lápis afiado e fazer o sombreado das noivas e da neve, deves gostar da cor cinzenta, viver debaixo de um céu com nuvens. O gato fala. Mas o que é que diz o gato? Deves vestir-te com o jornal da tarde, de serapilheira como as batatas e virar este fato uma vez atrás da outra e não pôr nunca um fato novo. O gato fala. Mas o que é que diz o gato? Devias riscar a Marinha, as cerejas, a papoila e o sangue do nariz, aquela bandeira também a tens de riscar e deitar cinza nos gerânios. Tu deves, continua o gato a dizer, viver só de rins, baço e fígado, do pulmão sem ar, ácido, da urina dos rins, não diluída, de baço estragado e fígado rijo, da panela cinzenta: é assim que deves viver. E na parede, onde antes o quadro verde ruminava o verde sem parar, deves escrever, com o teu lápis afiado, ascese, escreve: ascese. É assim que diz o gato: escreve ascese. Günter Grass