Malas sem atenção: assim parecem ser a maioria dos poemas. Malas abandonadas num aeroporto que ninguém busca ou reclama. Malas que não se podiam deixar e por isso mesmo se deixam, quando nos avisam pelo altifalante: "... por motivos de segurança não deixem abandonada qualquer mala nem se aproximem se virem uma". Isto é, por sua vez, a leitura de um poema: o encontro inesperado de um mundo metido e comprimido num pequeno concentrado de tempo - coisas de vestir, vários objectos de companhia, outros de primeira necessidade, roupa interior muita, até demais, e tudo, em geral desordenado, revolvido contra não sabemos quê ou quem, mas formando uma estranha unidade -, o envolvimento e as entranhas de um corpo desconhecido, uma segunda pele que gostamos de usar de vez em quando, - mudados, revestidos com outros olhos -, ou então nós mesmos mais que nunca - finalmente despidos do que sobra e na nossa nudez reencontrados. Àlex Susanna, trad. Egito Gonçalves