Achei muito estranho que acedessem à minha petição - à petição que irei relatar de seguida -, sem qualquer inquérito por escrito. Não tenho números suficientes para descrever como me senti feliz com a decisão. Nesse dia, à noite, ao jantar, levantei-me e declarei: Gostava de ter um poeta. Podemos comprar um? A mãe não disse nada, limitou-se a levantar a louça, quatro pratos de sopa, quatro colheres de sopa e informar os comensais, eu e o pai e o meu irmão, de que a carne seria servida de seguida, dentro de trinta segundos. O pai acabou de mastigar um bocado de pão, cerca de treze gramas, moveu os maxilares cinco vezes e inquiriu: Porque não um artista? A mãe disse: Nem pensar, fazem muita porcaria, a senhora 5638,2 tem um e despende três a quatro horas por dia a limpar a sujidade que ele faz com as tintas naqueles objectos brancos. Telas. Isso. Muito bem, disse o pai, compramos um poeta. De que tamanho? Afonso Cruz, in Vamos comprar um Poeta