A história da minha estupidez encheria fartos volumes.

Uns estariam dedicados à acção contra a consciência,
como o voo de uma falena que, mesmo sabendo-o,
não deixa de precipitar-se para a chama da vela.

Outros ocupar-se-iam das maneiras de afogar a ansiedade,
o murmúrio que adverte mas que não é escutado.

Trataria de maneira independente a satisfação e o orgulho,
quando era aquele que cria,
assim que avançava a passo vitorioso sem suspeitar de nada.

E tudo teria como tema o desejo. Se fosse
o meu próprio. Mas não. Por desgraça,
alentava-me porque eu queria ser como os outros.
Sentia medo face ao que era selvagem e arrogante em mim.

Já não escreverei a história da minha estupidez
porque é tarde e faz-se difícil chegar à verdade.

Czeslaw Milosz, versão de António Cabrita