Oficial de diligências, manco,
nunca lutou com Deus
nem O viu face a face.
Colava cacos de porcelana, refazia
leques, despertava velhos relógios.
Não gerou doze filhos, não conheceu
Lia, Raquel, suas escravas,
não tinha um só jumento.
A sua escada de salvação
(mesmo sonhando) jamais tocou
a extremidade do céu: chegava
à sua água-furtada. Desterrado
aguardava a vinda do Messias.
Não viveu cento e quarenta e sete anos.
Não lavou o fato sujo no sangue das uvas,
nem expirando se reuniu ao seu povo.

António Osório