Há todo um lado recreativo nos gritos de domingo

do qual raramente falamos;

É mais fácil, por escusado e habitual que seja,

deixar que o dia seguinte atrapalhe o próprio dia,

e que o dia em forma mais ou menos própria

se afogue em mágoa:

na mágoa de não ser este um domingo como os de outrora,

gozados a patins e a esperar escola,

querendo escola, o mais possível,

e múltiplas paixões

(entre outras, onde estás, Gigi?).

 

Soube agora mesmo,

no noticiário,

que o nosso presidente

esteve um quarto de hora

para chegar a um queijo

(nem mais nem menos)

e que nem isso lhe retirou o humor

e a disposição de sexta à tarde,

(disposição que enche de orgulho e fezada

uma larga maioria).

 

Foi confirmada a morte de Chuck Berry,

ocorrência que me proporcionou momentos musicais

muito agradáveis

(honra lhe seja feita).

 

No mesmo espaço de notícias

houve muita alegria

a recomeçar o dia

(afinal, não tão longo e demorado quanto isso),

a lembrar tempos épicos e já antigos,

para cá dos meus:

 

"Doidas doidas doidas andam as galinhas

para pôr o ovo lá no buraquinho;

Raspam, raspam, raspam

p'ra alisar a terra,

picam, picam, picam,

para fazer o ninho (...)"

 

E não sei se é do cansaço,

ou da espécie de laço;

Mas penso que verdadeiramente há uma lição imensa

(uma quase esperança, ou uma esperança sem vírgulas)

a retirar do fundo de um sorriso,

ainda mais se desarmado:

 

Quantas gerações de ditadores não honraram mães

e nos passaram pelas veias

(ou pelas veias de outros menos acomodados, o que é um facto),

quanta miséria, quantos queques a rir nos atormentaram?

(###, grandes cabrões, não haverá apelido que escape).

 

A infâmia mudará seus nomes,

mas há letras que enquanto lembrarmos

dão a alguns nomes (por outros que sucedam)

os nomes relevantes que merecem:

 

"Atirei o pau ao gato-to

mas o gato-to

não morreu-eu-Eu

Dona Xica-ca

assustou-se-se

com o berro

com o berro

que o gato

deu (...)"

 

Há tanta falta de amor, no mundo, no bairro e no quarto.

Mas hoje não vamos falar disso.

É domingo.

Por pouco que seja, não é conforto tão pouco quanto isso.

Rui A.