Repara, meu amor: são duas da manhã
e eu ainda aqui a começar
(na minha hora que tem sido a hora
onde poemas são e se entrelaçam)
São duas da manhã e sem luar:
não sei atravessar
-te pelo vidro
e criar
-te metáfora de brilho
São duas da manhã e o céu
tão escuro como carvão
-carvão:
onde vou inventar pequenos seixos
para fazer fogueira que te escorra?
Estamos dentro da noite que é mais noite
e que é que eu trago para te acordar?
Olha: ponho esta lâmpada a fingir
de estrela mais polar do que a polar,
e, vês, o vidro em frente: não me vejas
enrolada a escrever: é espelho mágico
e agora eu era o verso mais perfeito
e tu a mais perfeita das palavras
e às duas da manhã trago
-te: um céu,
são estrelas e mil luas, são seixos
mais galácticos que a luz, mais velozes
que a luz e no teu corpo, vês, a minha mão
é chão feito de luz e estrelas e do
carvão
-carvão nasceu um sol e do meu
pé, repara nesse céu: fogueira interestelar
e o que eu tinha escondido atrás do Tempo
e Deus: um tempo a sério para tu entrares

Ana Luísa Amaral