Esqueci-me de quem sou. Um rumo
de oráculos entontece as nuvens. O verso
não refere as indecisões do poeta, nem
o céu, que o outono manchou de sangue, se afasta de
um ritmo azul. No canto, ambos se juntam: o
branco de uma espuma que o naufrágio contamina; e
os cinzentos da superfície, desafiando um sol
que não rompe o temporal. No fundo, um mastro, quase
que o horizonte o esconde. Uma lógica de asas
o dirige para essa margem que
exclui o regresso. Por instantes, hesito
na própria sequência do raciocínio: procurar,
nos átrios da memória, o corredor de um vago
infinito; ou prosseguir a descida indicada
num charco de sombras? Depois, quando ouço o riso
que o abismo logo abafa, ouso a escolha
do início. O nome impede, a quem interroga
os lábios ocultos, que uma resposta
se ouça.

Nuno Júdice