Os deuses, quando existissem,
tinham decerto esse rosto
onde exulta a juventude.
Palavra tão desvairada,
juventude, juventude,
pássaro de tantas cores.
No entanto, porque será?,
o pássaro doce canta
mas canta em silêncio e é triste,
inconsciente talvez
de que o mundo lhe pertence
mas é preciso querê-lo.
E dúvidas desabrocham
em cada fio de cabelo
alvoroçado no vento.
Seus olhos, tão espantados,
fecham-se sempre que alguém
humanamente diria
(a bebida ajuda muito)
que estou doido, que te amo,
como num sonho dourado,
como num filme barato,
que eu estou apaixonado
ou alguma coisa assim,
uma coisa bem terrena,
mas que enleva, que arrebata:
cigarro, canção, poemas.
Tivesse havido esse tempo
dos homens e deuses juntos,
eu bem sei como seria,
azul e dor de mãos dadas.

Eucanaã Ferraz