Palavra /névoa, palavra /névoa: era assim comigo.
E, todavia, o meu silêncio nunca foi completo —
Como uma cortina a levantar-se sobre uma paisagem,
às vezes a névoa dissipava-se: hélas, o jogo acabava.
O jogo acabava e a palavra ficara
um pouco achatada pelos elementos,
achando-se agora a um tempo recuperada e inútil.
Eu alugava, na altura, uma casa de campo.
Os campos e as montanhas tinham ocupado o lugar dos prédios.
Os campos, as vacas, os ocasos sobre o prado húmido.
A noite e o dia diferenciados por chamamentos de aves em rotação,
os afadigados murmúrios e restolhos fundindo-se em
certa coisa parecida com o silêncio.
Sentava-me, passeava. Quando vinha a noite,
ia para dentro. Cozinhava para mim jantares singelos
à luz das velas.
Ao fim da tarde, quando podia escrevia no meu diário.
Lá muito ao longe ouvia badalos de vacas
cruzando o prado.
A noite calava-se a seu modo.
Pressentia as palavras desaparecidas
dormindo acompanhadas,
como fragmentos de uma biografia não assumida
[…]
Louise Glück, trad. Margarida Vale de Gato