Se me ocorre uma história que me sinto incapaz de formular, é aí que começo um livro. Quero escrever sobre o que não entendo. É assim que vou contornando os problemas, e chamam isso estilo experimental. Na verdade, é uma atitude de enfrentamento. E de liberdade.
É por isso que não creio na profundidade. O que existe são infinitas superfícies sobrepostas. Quando se aprofunda demasiado um assunto, acaba-se saindo pelo outro lado, de mãos abanando.
Escrever é um acto impossível, porque tudo o que interessa vem antes das palavras, como as intenções, os desejos, a loucura.
Os poetas são maiores porque conseguem transferir essas coisas inomináveis para as palavras.
Mas escrever também é um ofício, como o de carpinteiro. É preciso conhecer a técnica, para abandoná-la.
Todo grande livro é uma reflexão profunda sobre a arte de escrever. Cada livro meu tem de ser um mundo.

António Lobo Antunes.