Itinerante (ou o prazer
Itinerante
(ou o prazer oculto)
Nova etapa desviante do locus habitual se aproxima: reunido de novo o núcleo duro, a terceira (e última!) deslocação para sul está para breve. Lá vem a nefanda consequência: ficar um pouco mais de uma semana sem blogues nem correio electrónico; mas, por outro lado, aí vem imenso tempo para ler, tardes e noites individisas, só o sono a ditar a sua vontade irreprimível contra mais uma página virada. Na verdade, tirando as manhãs (alegremente iniciadas a horas de arrepiar quem vê nas férias a fuga dos hábitos de todo o ano), dedicadas à indispensável intendência e ao mar, o resto do tempo é para devorar as palavras dos outros. Depois, haverá uns dias sem o imenso azul, mas com o cantar das águas claras do rio que corre debaixo da janela, num vale pequeno e estreito esculpido no fundo das serras; os ruídos da noite no campo, o silêncio diferente, o céu recortado de outra maneira. Aí haverá também tempo para escrever, retomar algum trabalho para o próximo ano, concluir artigos, rever provas do novo (etão árido...) manual. E só no fim do verão, duas (talvez três, com sorte...) viagens, sempre desejadas com gosto antecipado das coisas novas,outros sons,jornais escritos em línguas diferentes.
Aprendi que viajar pode ser feito de muitos modos, explorando território para desejos diversos, com prazer acrescido minuto a minuto pela companhia de quem amamos, ou com a serenidade (às vezes desafiante) da solidão. Sobre viagens, sei que nunca poderei voltar ao prazer sofisticado de algumas, sei que não pretendo medir a minha autonomia como fiz em outras, mais antigas; só não sei o que vou aprender com todas as viagens que fizer ainda.
Ana Roque
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Publicado em 27 de Julho de 2003